terça-feira, 17 de março de 2015

A LUA NOVA – Manoel Azevedo da Silveira Neto



No silêncio da cor - treva silente -
abriu-se a noite mádida e sombria,
logo que o Sol, rezando: Ave Maria...
fechou no Ocaso as portas de oiro ardente.
 
  A terra, a mata, o rio, a penedia,
tudo se fora pela treva e, rente
ao céu, ficou a lua nova algente,
como um sonho esquecido pelo dia.
 
  Ela assim foi: morreu; desde esse instante,
pálido e frio, como a lua nova,
 ficou-me entre as saudades seu semblante.
 
  Mas, ouve: quanto mais doída cresce
 a noite que me vem da sua cova, 
mais branca e inda mais fria ela aparece.

A NUVEM – Teófilo Dias



Sulcas o ar de um rastro perfumoso
que os nervos me alvoroça e tantaliza,
 quando o teu corpo musical desliza
ao hino do teu passo harmonioso.
 
A pressão do teu lábio saboroso
verte-me na alma um vinho que eletriza,
que os músculos me embebe, e os nectariza,
e afrouxa-os, num delíquio langoroso.
 
E quando junto a mim passas, criança,
revolta a crespa, luxuosa trança,
 na espádua arfando em túrbidos negrumes,
 
naufraga-me a razão em sombra densa,
 como se houvera sobre mim suspensa
uma nuvem de cálidos perfumes!

CLEÓPATRA - Alberto Samain

 (Tradução de Álvaro Reis)
 
Densa, a noite a pesar sobre o Nilo obscuro.
Cleópatra, arrebatada à luz fria e esplendente
dos astros, afastando as servas, de repente,
rasga as vestes num gesto impudico e seguro.
 
De pé, no alto terraço, a plástica imponente
 mostra cheia de amor como um fruto maduro!
 Toda nua, ela vibra, ignívoma serpente,
do vento ao morno beijo, alva, no cimo escuro.
 
Ela quer tenha o mundo esta noite o perfume
da sua carne! E ao olhar, fulge-lhe estranho lume...
- sombria flor do sexo esparsa no ar noturno

- E a Esfinge, pelo areal do tédio taciturno,
sente um fogo invadir-lhe o impassível granito,
- e um frêmito percorre o deserto infinito...